quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A temperatura também sobe nas eleições

por Perci Guzzo *

(Postagem original em 05/10/2018)



Nos debates entre os presidenciáveis e nas entrevistas aos jor­nalistas, o tema das mudanças climáticas não tem sido abordado e discutido como merece. Tão pouco os outros problemas ambientais. É gritante não se ouvir uma palavra sobre propostas e desafios para a região amazônica, por exemplo. Mas os projetos de governo dos candidatos à presidência tratam, bem ou mal, desses assuntos, e fo­ram protocolados junto à Justiça Eleitoral. Quantos de nós acessam tais informações?

O Observatório do Clima (OC), uma coalização de organizações da sociedade civil que acompanha as mudanças climáticas no país, publicou o posicionamento dos candidatos em relação ao que pre­tendem fazer perante as causas e os efeitos do aquecimento global. Há propostas muito oportunas como aquelas que apontam uma economia diversificada, de baixo carbono, com a oportunidade de geração de milhares de empregos na lógica da sustentabilidade. Por outro lado, por parte de alguns postulantes ao Palácio do Planalto, nota-se o desprezo pelo assunto e ideias retrógradas que se coloca­das em prática desestabilizarão o funcionamento das sociedades e de seus ambientes.

Convido o leitor que valoriza a qualidade de vida da atual e das futuras gerações que visite o site www.observatoriodoclima.eco.br com o objetivo de avaliar a posição de seu candidato perante assunto relevante para a humanidade.

O Acordo de Paris foi firmado em 2015 com a meta de conter o aquecimento do planeta em no máximo 1,5ºC a temperatura média global até o final deste século. Desta maneira, segundo os estudiosos da área, os ecossistemas terão condições de se adaptarem às mudan­ças ambientais provocadas pela nova condição climática. O Brasil assumiu o compromisso das seguintes metas até 2030: diminuir em 43% a emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE); obter 45% de sua energia por meio de fontes renováveis, incluindo a hidroeletricidade; zerar o desmatamento ilegal e restaurar 12 milhões de hectares de florestas.

No Brasil o Acordo foi ratificado em 2016 e promulgado em 5 de junho de 2017, passando a ter força de lei. Quem abandonou o propósito mútuo firmado na ONU, advogando “ameaça à soberania nacional”, contribui para o enfraquecimento do multilateralismo, principal mecanismo que pauta as relações diplomáticas entre as nações. Assumir um projeto coletivo dessa grandeza é tarefa para pessoas e nações à frente de seu tempo.

A alteração do uso da terra, ou seja, o desmatamento, repre­senta metade das emissões brutas de GEE no Brasil, seguido pela atividade agropecuária com 22%, o setor energético com 19%, e as indústrias e a geração de lixo com 4% cada um. As emissões de CO2, CH4, N2O e os outros gases de efeito estufa, são mensuradas por meio de protocolos técnicos e é expressa em MtCO2e. Quando se corta a floresta, o cerrado, a caatinga e os campos naturais para dar lugar à pecuária, à agricultura e à urbanização, o CO2 que estava preso na biomassa é liberado para a atmosfera.

As principais emissões vindas do setor agropecuário, além do desmatamento para expansão da fronteira agrícola, é a fermentação entérica que ocorre nos bovinos ruminantes que produz metano (CH4) – pum da vaca – e a aplicação de fertilizantes nitrogenados nos solos para “adequá-los” à produção de grãos.

A temperatura subirá ainda mais no segundo turno das eleições e o país já está visivelmente febril. Nós estamos ficando doentes como sociedade e isso traz muito sofrimento.“Vontade de beijar os olhos de minha pátria. De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabe­los…” (Vinícius de Moraes, Pátria Minha).

(*) Perci Guzzo é ecólogo e mestre em Geociências e Meio Ambiente.

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